Pular para o conteúdo principal

Destaques

LEI DE RECIPROCIDADE E SEU DECRETO REGULAMENTADOR DE 14 DE JULHO DE 2025 - INSTRUMENTOS DE SOBERANIA ECONÔMICA: ANÁLISE JURÍDICO-DOUTRINÁRIA DA LEI Nº 15.122/2025 E SUA REGULAMENTAÇÃO - UMA NOVA FRENTE DE ATUAÇÃO PARA OS OPERADORES DO DIREITO ECONÔMICO, DO DIREITO INTERNACIONAL E DO DIREITO EMPRESARIAL NO BRASIL

  LEI DE RECIPROCIDADE E SEU DECRETO REGULAMENTADOR DE 14 DE JULHO DE 2025 - INSTRUMENTOS DE SOBERANIA ECONÔMICA: ANÁLISE JURÍDICO-DOUTRINÁRIA DA LEI Nº 15.122/2025 E SUA REGULAMENTAÇÃO - UMA NOVA FRENTE DE ATUAÇÃO PARA OS OPERADORES DO DIREITO ECONÔMICO, DO DIREITO INTERNACIONAL E DO DIREITO EMPRESARIAL NO BRASIL                                                       PROFESSOR CARLOS ALEXANDRE MOREIRA Resumo Este artigo analisa, sob uma perspectiva jurídico-doutrinária e jurisprudencial, a Lei nº 15.122/2025 — conhecida como Lei da Reciprocidade Econômica — e o decreto presidencial que a regulamentou, publicado em 14 de Julho de 2025. Trata-se de um marco normativo na estrutura de defesa comercial brasileira, que permite a aplicação de medidas de retaliaç...

DIREITO ECONÔMICO: A CONCORRÊNCIA FUNCIONAL COMO DIREITO FUNDAMENTAL ESTRUTURAL. UMA RELEITURA ECONÔMICO-CONSTITUCIONAL DA DEFESA DA CONCORRÊNCIA NO BRASIL

 

DIREITO ECONÔMICO: A CONCORRÊNCIA FUNCIONAL COMO DIREITO FUNDAMENTAL ESTRUTURAL. UMA RELEITURA ECONÔMICO-CONSTITUCIONAL DA DEFESA DA CONCORRÊNCIA NO BRASIL

FUNCTIONAL COMPETITION AS A STRUCTURAL FUNDAMENTAL RIGHT: AN ECONOMIC-CONSTITUTIONAL REINTERPRETATION OF COMPETITION DEFENSE IN BRAZIL

        Professor Carlos Alexandre Moreira

RESUMO

Este artigo propõe a formulação da Doutrina da Concorrência Funcional, reconceituando a livre concorrência como direito fundamental estrutural com base nos princípios constitucionais da ordem econômica brasileira. A partir de uma releitura da Lei nº 12.529/2011, sustenta-se que a análise de condutas e atos de concentração deve priorizar critérios de funcionalidade sistêmica, como contestabilidade, eficiência dinâmica e inovação, em detrimento de modelos meramente estruturalistas. A tese fundamenta-se em doutrina nacional e estrangeira, jurisprudência constitucional e análise econômica contemporânea.

Palavras-chave: Concorrência funcional; Direito econômico; Livre concorrência; CADE; Constituição Federal.

ABSTRACT

This article proposes the formulation of the Doctrine of Functional Competition, reconceptualizing free competition as a structural fundamental right based on the constitutional principles of Brazil's economic order. Through a reinterpretation of Law No. 12,529/2011, it argues that the analysis of conduct and concentration acts should prioritize systemic functionality criteria, such as contestability, dynamic efficiency, and innovation, over merely structuralist models. The thesis is grounded in national and foreign doctrine, constitutional jurisprudence, and contemporary economic analysis.

Keywords: Functional competition; Economic law; Free competition; CADE; Federal Constitution.

SUMÁRIO

1.     Introdução

2.     Fundamento Constitucional da Concorrência Funcional
2.1. Concorrência como Direito Fundamental de Função Organizadora
2.2. Função Teleológica da Concorrência

3.     A Lei nº 12.529/2011 à Luz da Concorrência Funcional
3.1. Fundamento Normativo
3.2. Limites do Modelo Estruturalista

4.     Definição e Conteúdo da Doutrina da Concorrência Funcional
4.1. Conceito Proposto
4.2. Critérios Operacionais

5.     Jurisprudência e Direito Comparado
5.1. Jurisprudência Nacional
5.2. Direito Comparado

6.     Conclusão

7.     Referências

1. INTRODUÇÃO

A evolução do Direito da Concorrência no Brasil exige a superação do paradigma estruturalista tradicional, baseado exclusivamente na análise da concentração de mercado, participação percentual e efeitos potencialmente excludentes. Em tempos de economia digital, inovação disruptiva e assimetrias de escala e rede, impõe-se o desenvolvimento de modelos analíticos mais sofisticados e funcionais.

Neste contexto, propõe-se a formulação da Doutrina da Concorrência Funcional, que reconhece a concorrência como instituto jurídico-funcional, dotado de conteúdo normativo constitucional, voltado não à mera pluralidade formal de agentes, mas à garantia de rivalidade econômica efetiva, inovação, inclusão e eficiência sistêmica.

2. FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL DA CONCORRÊNCIA FUNCIONAL

2.1. Concorrência como Direito Fundamental de Função Organizadora

A Constituição Federal de 1988 estabelece no art. 170, IV, que a ordem econômica brasileira se funda na “livre concorrência”. Este dispositivo deve ser compreendido como princípio de eficácia plena e aplicação imediata, dotado de função estruturante.

Conforme Canotilho, princípios estruturantes são aqueles que "informam a constituição econômica e organizam as bases do sistema"¹. A livre concorrência, nesse aspecto, deve ser interpretada funcionalmente como um direito fundamental de estrutura organizacional, à semelhança dos direitos sociais ou ambientais.

Barroso sustenta que os princípios constitucionais econômicos são normas de aplicação direta, inclusive contra o Estado, servindo como parâmetro de controle jurisdicional de políticas públicas e atos administrativos².

2.2. Função Teleológica da Concorrência

A concorrência, enquanto fenômeno jurídico, serve para limitar o poder econômico, ampliar o acesso a mercados e garantir a inovação. Sua função não é estática, mas dinâmica, como instrumento de realização de uma economia de mercado orientada à justiça social (art. 170, caput, CF/88).

Não é, portanto, a multiplicidade de empresas que assegura a concorrência, mas a sua capacidade funcional de gerar alternativas reais, de forma contestável e inclusiva.

3. A LEI Nº 12.529/2011 À LUZ DA CONCORRÊNCIA FUNCIONAL

3.1. Fundamento Normativo

A Lei nº 12.529/2011 dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica. Seu art. 36, §2º, reconhece como ilícitas as condutas que tenham por objeto ou possam produzir efeitos anticoncorrenciais, “ainda que não sejam alcançados”.

Essa redação permite uma interpretação funcionalista e teleológica, voltada à verificação dos impactos reais (ou potenciais relevantes) da conduta sobre o dinamismo da rivalidade econômica.

3.2. Limites do Modelo Estruturalista

O modelo estruturalista tradicional – ancorado em índices como HHI (Herfindahl-Hirschman Index) ou participação de mercado – foi útil em mercados industriais clássicos, mas mostra-se insuficiente diante de mercados digitais, multilaterais ou com forte presença de barreiras comportamentais³.

A análise funcional propõe o abandono do foco exclusivo na estrutura para adotar critérios como:

  • Contestabilidade⁴;
  • Eficiência dinâmica⁵;
  • Externalidades de rede e inovação difusa.

4. DEFINIÇÃO E CONTEÚDO DA DOUTRINA DA CONCORRÊNCIA FUNCIONAL

4.1. Conceito Proposto

Concorrência Funcional é a capacidade sistêmica de o mercado gerar rivalidade econômica efetiva, com pluralidade de escolhas, inovação contínua e acesso equitativo às oportunidades econômicas, independentemente da quantidade formal de agentes econômicos.

4.2. Critérios Operacionais

  • Eficiência sistêmica: Avaliação da capacidade do mercado de promover inovação, inclusão e desempenho produtivo.
  • Contestabilidade: Verificação da liberdade real de entrada e saída de agentes.
  • Rivalidade dinâmica: Existência de estímulos econômicos para inovação, mesmo em ambientes concentrados.
  • Inclusividade econômica: Potencial da estrutura concorrencial para democratizar o acesso a mercados.

5. JURISPRUDÊNCIA E DIREITO COMPARADO

5.1. Jurisprudência Nacional

Embora ainda incipiente, decisões do CADE vêm, gradualmente, reconhecendo elementos da análise funcional. No Ato de Concentração nº 08700.002390/2020-14, por exemplo, admitiu-se a aprovação de operação concentradora com base em ganhos de escala e eficiência, apesar do HHI elevado.

No Judiciário, decisões como a proferida pela 1ª Vara Federal de São Paulo (Processo nº 5011327-32.2022.4.03.6100) indicam a abertura do controle jurisdicional ao exame de mérito econômico, quando ausente razoabilidade técnica na decisão administrativa.

5.2. Direito Comparado

A União Europeia adota, desde 2004, o teste dos “efeitos significativos de restrição de concorrência” (SIEC Test), que prioriza análise de impacto, e não estrutura. Os Estados Unidos, com a abordagem da “workable competition” e a teoria da contestabilidade de mercados, também caminham na direção funcionalista⁶.

6. CONCLUSÃO

A Doutrina da Concorrência Funcional permite reconceituar a livre concorrência como direito fundamental de natureza funcional, integrando o conjunto dos direitos econômicos com função organizadora da ordem econômica e instrumento de controle do poder de mercado.

Trata-se de construção teórica inovadora, com imediata aplicação no âmbito do CADE, do Judiciário e da formulação de políticas públicas, legitimando práticas antes vistas como presumivelmente anticompetitivas, mas que, sob a ótica funcional, produzem ganhos líquidos de bem-estar, inovação e inclusão econômica.

7. REFERÊNCIAS

1.     CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003.

2.     BARROSO, Luís Roberto. *O Direito Constitucional e a efetividade dos princípios constitucionais: limites e possibilidades da Constituição brasileira. São Paulo: Saraiva, 2009.¹

3.     POSNER, Richard A. Antitrust Law. 2. ed. Chicago: University of Chicago Press, 2001.²

4.     BAUMOL, William J.; PANZAR, John C.; WILLIG, Robert D. Contestable Markets and the Theory of Industry Structure. New York: Harcourt Brace Jovanovich, 1982.³

5.     MOTTA, Massimo. Competition Policy: Theory and Practice. Cambridge: Cambridge University Press, 2004.⁴

6.     WHISH, Richard; BAILEY, David. Competition Law. 10. ed. Oxford: Oxford University Press, 2021.⁵

7.     FOX, Eleanor M.; GERADIN, Damien. EU Competition Law and US Antitrust Law: A Comparative Guide. Cheltenham: Edward Elgar, 2017.⁶

8.     TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional Econômico. São Paulo: Método, 2015.⁷

9.     PIERRE, Christian. Le droit de la concurrence en Europe. Paris: Dalloz, 2018.⁸

10. GAVIL, Andrew I.; KOVACIC, William E.; BAKER, Jonathan B. Antitrust Law in Perspective: Cases, Concepts and Problems in Competition Policy. 3. ed. St. Paul: West Academic Publishing, 2017.⁹

 

 

Comentários

Visitas