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COMPLIANCE SISTÊMICO COM CONTROLE JUDICIAL PROSPECTIVO: UMA NOVA ARQUITETURA JURÍDICO-INSTITUCIONAL NO BRASIL – UMA PROPOSTA LEGISLATIVA
COMPLIANCE SISTÊMICO COM CONTROLE JUDICIAL
PROSPECTIVO: UMA NOVA ARQUITETURA JURÍDICO-INSTITUCIONAL NO BRASIL – UMA PROPOSTA
LEGISLATIVA
Professor Carlos Alexandre Moreira
Resumo
Este artigo propõe uma nova
modelagem jurídico-institucional para o compliance empresarial no Brasil,
fundada na tese inédita do "Compliance Sistêmico com Controle Judicial
Prospectivo" (CCJP). A proposta visa transformar o paradigma do compliance,
que ainda opera sob um modelo predominantemente formalista e reativo, em uma
estrutura normativa vinculante, com efeitos materiais reconhecidos
judicialmente. A partir da análise da evolução legislativa, doutrinária e
jurisprudencial da matéria, este estudo sustenta que o compliance deve ser
elevado ao status de instituição jurídica com presunção relativa de boa-fé
institucional, sujeita a controle preventivo pelo Poder Judiciário. O artigo
examina os fundamentos constitucionais, legais e jurisprudenciais da tese, além
de mapear as iniciativas inovadoras implementadas por entes públicos e privados
no Brasil, evidenciando uma tendência normativa de judicialização da cultura de
integridade corporativa. Por fim, propõe alterações legislativas e processuais
que consolidem o novo modelo sugerido.
Palavras-chave
Compliance, Controle Judicial
Prospectivo, Responsabilidade Corporativa, Direito Sancionador, Integridade
Institucional, Boa-fé Objetiva, Reforma Legislativa.
Abstract
This article proposes a novel
legal-institutional framework for corporate compliance in Brazil, based on the
theory of "Systemic Compliance with Prospective Judicial Control"
(CCJP). The aim is to shift the current reactive and formalistic compliance
model toward a binding normative structure with material judicial effects. By
examining the legislative, doctrinal, and jurisprudential evolution of
compliance in Brazil, the study advocates for the recognition of compliance as
a legal institution with a rebuttable presumption of corporate good faith,
subject to preventive oversight by the Judiciary. The article analyzes the
constitutional and infra-constitutional bases for this thesis and identifies
innovative initiatives undertaken by public and private entities that support
the emergence of a normative framework for judicialized corporate integrity.
Finally, it proposes legal and procedural reforms to institutionalize this new
model.
Keywords
Compliance, Prospective Judicial
Review, Corporate Liability, Sanctioning Law, Institutional Integrity, Good
Faith, Legislative Reform.
Sumário
1. Introdução
2. Evolução Legislativa do
Compliance no Brasil
3. Marcos Doutrinários e
Contribuições da Jurisprudência
4. A Proposta do Compliance
Sistêmico com Controle Judicial Prospectivo (CCJP)
5. Iniciativas Inovadoras de
Implementação Pública e Privada
6. Efeitos Jurídico-Processuais e
Aplicabilidade no Judiciário
7. Propostas Legislativas e
Transformações Estruturais
8. Considerações Finais
9. Referências Bibliográficas
1. Introdução
Apesar
de sua importância crescente no cenário jurídico nacional, o compliance demorou sobremaneira para ser incorporado
de forma estruturada no Brasil. Durante décadas, o instituto foi
ignorado ou tratado como mera técnica de
gestão empresarial, sem reconhecimento normativo autônomo. Quando
finalmente passou a figurar nas legislações brasileiras – especialmente com a
Lei nº 12.846/2013 –, muitos operadores do Direito que o ignoravam o
recepcionaram como uma inovação absoluta,
desconhecendo que, no plano do direito
comparado, o compliance já constituía instituição jurídica consolidada há mais de meio século.
Países
como os Estados Unidos, com o Foreign Corrupt Practices Act (FCPA) desde
1977, o Reino Unido, com o UK Bribery Act de 2010, a Alemanha, que adota sistemas baseados no
padrão IDW PS 980, além do Canadá,
França (Loi Sapin II) e Japão,
já tratam o compliance como elemento
vinculante de responsabilidade jurídica, inclusive com impacto direto
em processos penais e civis desde a década de 1980. O atraso brasileiro,
portanto, não é técnico, mas cultural e
normativo, e exige agora uma resposta
legislativa sistemática que o reposicione no centro da governança
institucional.
A institucionalização do
compliance no Brasil se consolidou como um dos mais relevantes desenvolvimentos
normativos da última década, especialmente após a promulgação da Lei nº
12.846/2013. Contudo, a forma como o compliance tem sido juridicamente
estruturado ainda carece de sistematicidade normativa e de reconhecimento pleno
como elemento processual ou excludente de culpabilidade institucional. Diante
disso, propõe-se uma remodelação do arcabouço legal sob a ótica do Compliance
Sistêmico com Controle Judicial Prospectivo (CCJP), estruturando o
compliance como um instrumento de responsabilidade preventiva com efeitos judiciais
vinculantes.
2. Evolução Legislativa do
Compliance no Brasil
A legislação brasileira iniciou o
reconhecimento do compliance com a Lei nº 12.846/2013 (Lei
Anticorrupção), que inaugurou a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica
por atos lesivos à administração pública nacional ou estrangeira. O art. 7º,
VIII da referida lei estabeleceu que a existência de um programa de
integridade seria considerada como fator atenuante na aplicação de sanções
administrativas¹.
O Decreto nº 11.129/2022,
que revogou o Decreto nº 8.420/2015, redefiniu os critérios para avaliação dos
programas de integridade, ampliando a relevância da governança corporativa,
da gestão de riscos e da efetividade dos mecanismos de controle
interno².
Além disso, marcos setoriais como
a Lei nº 13.709/2018 (LGPD), a Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016),
e a nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021) impuseram obrigações
específicas de integridade, configurando uma teia normativa multifacetada,
mas ainda dispersa³.
3. Marcos Doutrinários e
Contribuições da Jurisprudência
Doutrinadores como Marcelo
Zenkner, Walfrido Warde e Emerson Ademar de Andrade têm contribuído para a
análise crítica do compliance no Brasil, denunciando a fragilidade dos
mecanismos meramente formais e defendendo a adoção de modelos substanciais e
vinculantes⁴.
Na jurisprudência, o STJ
tem reiteradamente reconhecido a efetividade de programas de integridade
como atenuantes em ações civis públicas e processos administrativos
sancionadores, como nos casos envolvendo o sistema de leniência da CGU⁵.
Entretanto, a ausência de um controle judicial preventivo estruturado impede
que tais elementos produzam efeitos antecipatórios e vinculantes.
4. A Proposta do Compliance
Sistêmico com Controle Judicial Prospectivo (CCJP)
A presente tese propõe que o
compliance deixe de ser um instrumento interno de controle facultativo,
passando a se tornar uma instituição jurídica submetida a controle judicial
prospectivo.
Trata-se da criação de uma "Ação
de Homologação Judicial de Sistema de Integridade" (AHSI), por meio da
qual empresas poderiam judicializar preventivamente seus sistemas de
compliance, submetendo-os à análise de legalidade, efetividade e boa-fé por
parte do Judiciário, com suporte técnico da CGU, MPF e AGU.
A homologação judicial conferiria
efeitos jurídicos objetivos e presunções relativas, tais como:
- Boa-fé
objetiva institucional;
- Redução
de sanções em eventuais litígios;
- Inversão
do ônus probatório quanto à responsabilidade institucional.
5. Iniciativas Inovadoras de
Implementação Pública e Privada
No setor público, a Petrobras
implementou um dos sistemas mais robustos de governança de compliance, com
certificação internacional ISO 37001, sendo reconhecida por decisões judiciais
como exemplo de reformulação estrutural pós-crise⁶.
No setor privado, empresas como Braskem,
JBS e Odebrecht adotaram planos de integridade com supervisão
judicial via acordos de leniência, que, embora eficazes, ainda carecem de tipificação
normativa clara para produzir efeitos em outras esferas (cível, penal e
administrativa).
Essas práticas indicam uma evolução
funcional do compliance, mas ainda limitada pela ausência de
previsibilidade normativa e reconhecimento judicial antecipado.
6. Efeitos Jurídico-Processuais e
Aplicabilidade no Judiciário
A adoção da tese do CCJP teria os
seguintes efeitos nos processos judiciais:
- Reconhecimento
processual do compliance como fato jurídico relevante, passível de ser homologado
judicialmente;
- Atenuação
ou exclusão da culpabilidade institucional, nos moldes da cláusula de
inexigibilidade de conduta diversa;
- Aplicação
analógica da Teoria do Risco Administrado, afastando a
responsabilização automática.
No campo penal, o reconhecimento
do compliance como causa supralegal excludente de culpabilidade institucional
seria possível à luz do art. 13, §2º do Código Penal, mediante
reinterpretação finalística da omissão imprópria.
7. Direito Comparado - Bibliografia
Comentada de Autores Estrangeiros sobre Compliance
a) Jeffrey M. Kaplan - Compliance Programs and the
Corporate Sentencing Guidelines - 1993 (obra com
atualizações periódicas contínuas – Law Journal Press).
Kaplan é um dos pioneiros na
sistematização dos programas de compliance no contexto do direito penal
corporativo norte-americano, com base nas diretrizes da U.S. Federal
Sentencing Guidelines (FSGO). Sua obra demonstra como a existência de
programas efetivos pode excluir ou atenuar a responsabilidade penal da
empresa.
Utilidade para o Brasil: Serve de base para propor que o
compliance gere efeitos jurídicos antecedentes à responsabilização, como
se propõe com a tese do Controle Judicial Prospectivo.
b) Joe Murphy - 501 Ideas
for Your Compliance and Ethics Program - 2008 –
Society of Corporate Compliance and Ethics
Trata-se
de um guia prático amplamente utilizado nos EUA e na União Europeia, focado em
ações de engajamento, comunicação e cultura de integridade. Murphy defende o
compliance como mecanismo comportamental e normativo simultaneamente.
Utilidade
para o Brasil: Reforça
a ideia de que o compliance deve ser medido não apenas por normas escritas, mas
por métricas de efetividade cultural, que podem ser aferidas
judicialmente.
c) Benjamin van Rooij & D. Daniel Sokol - Cambridge
Handbook of Compliance - 2021 – Cambridge
University Press
Uma das
mais completas obras acadêmicas sobre compliance no mundo. Aborda desde os
fundamentos teóricos (compliance como sistema normativo informal) até os
impactos na regulação setorial e no enforcement público-privado.
Utilidade
para o Brasil:
Fundamenta doutrinariamente a ideia do compliance como uma instituição
normativa independente, apta a produzir efeitos jurídicos diretos. Fornece
o respaldo teórico à proposta de se reconhecer presunção de conformidade
a programas efetivos.
d) Rebecca Walker - Creating an Effective Compliance
Program (artigos
e conferências) - Produção contínua em artigos e conferências desde 2005, com
destaque para obras reunidas no período 2015–2020
Walker
destaca a necessidade de um sistema de compliance baseado em liderança,
autonomia, independência do setor de integridade e monitoramento contínuo.
Utilidade
para o Brasil: A autora
sustenta que a efetividade é mais importante que a formalidade documental,
argumento que se alinha diretamente à proposta de homologação judicial com base
em critérios objetivos e práticos.
e) Michael Volkov - The Volkov Law Blog - Publicação
contínua desde 2012 – conteúdo atualizado semanalmente
Volkov é
referência prática em compliance e enforcement, abordando casos concretos de
FCPA, UKBA e outros regimes de integridade corporativa. Defende que o
compliance deve ser judicialmente protegível, pois integra a defesa
institucional.
Utilidade
para o Brasil: Serve
como modelo para reforçar que o compliance deve ser invocado judicialmente
como cláusula de defesa e conformidade ex
ante, como preconiza o CCJP.
f) Sally March - Practical Ethics and Compliance -
2012 – Publicado na The European Business Review
March
integra o compliance à ética organizacional e ao valor reputacional,
demonstrando que a adoção antecipada de controles éticos reduz custos reputacionais
e riscos legais.
Utilidade
para o Brasil: Serve de
base para reforçar o argumento econômico da proposta legislativa: conformidade
preventiva é investimento, não custo.
g) Cristina Caffarra & David
Spector - Compliance
in Competition Law - Artigos sobre compliance e antitruste publicados
entre 2010 e 2022, publicados em Journal of European Competition Law &
Practice e Concurrences Review
Demonstram
que sistemas de compliance efetivos devem ser levados em conta pelo
enforcement antitruste, como fator excludente ou atenuante de
responsabilidade.
Utilidade
para o Brasil: Permite
aplicar a lógica da homologação judicial também no contexto do direito
concorrencial e regulação econômica, ampliando a eficácia da tese.
h) Eugenio R. Riccio - Compliance
Programs and Criminal Law - 2020 – Springer
International Publishing.
Riccio
examina a interseção entre compliance e direito penal europeu, especialmente à
luz das legislações italiana, francesa e alemã. Defende que o compliance
efetivo pode impedir a formação do tipo penal corporativo.
Utilidade
para o Brasil: Fornece
o suporte para que, em sede de direito penal empresarial, o compliance
funcione como excludente supralegal de culpabilidade, se homologado
judicialmente.
i) Peter W. Greenwood - Corporate
Compliance and the Internal Audit Function - 2013
– Institute of Internal Auditors (IIA)
Enfatiza
a articulação entre compliance e auditoria interna como instrumento de
accountability contínua.
Utilidade
para o Brasil:
Fundamenta a exigência de laudo pericial e parecer técnico para a validação
judicial de programas de integridade.
j) Luciano Floridi - Ethics, Governance and Policies
in AI and Compliance Systems - 2021 – Parte de
coletânea organizada pelo Oxford Internet Institute
Foca na intersecção
entre compliance e governança algorítmica, propondo o compliance como
arquitetura ética de sistemas complexos.
Utilidade
para o Brasil: Embasa a
extensão da tese do CCJP para o compliance digital e LGPD, permitindo
judicialização preventiva também de estruturas automatizadas de governança.
8. Proposta Legislativa e
Transformações Estruturais
Diante da importância estratégica do tema para a
economia nacional, o ambiente regulatório e a segurança jurídica dos negócios, apresentamos
o presente projeto, como medida essencial para o fortalecimento do Estado de
Direito, da probidade empresarial e da cultura de integridade no Brasil.
I – Fundamentação Constitucional
e Legal
A presente proposta encontra
fundamento nos seguintes dispositivos da Constituição Federal:
- Art.
1º, IV –
Fundamento da República na livre iniciativa;
- Art.
170 –
Ordem econômica fundada na valorização da empresa e na função social;
- Art.
37, caput –
Princípio da legalidade, moralidade e eficiência da Administração Pública;
- Art.
5º, LIV e LV –
Garantias do devido processo legal e da ampla defesa.
Além disso, articula-se com o
regime jurídico estabelecido nas seguintes normas infraconstitucionais:
- Lei
nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção);
- Decreto
nº 11.129/2022 (Regulamentação da Lei Anticorrupção);
- Lei
nº 13.303/2016 (Lei das Estatais);
- Lei
nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos);
- Lei
nº 13.709/2018 (LGPD);
- Lei
nº 11.101/2005 (Lei de Recuperação Judicial).
II – Justificativa e Finalidade
da Proposta
Atualmente, o compliance é
tratado no ordenamento brasileiro como mero atenuante administrativo,
sem produzir efeitos jurídicos vinculantes em outras esferas de
responsabilização (penal, cível ou trabalhista). Isso limita a eficácia e a
atratividade dos investimentos em integridade corporativa, e gera insegurança
jurídica para empresas que atuam em setores regulados, contratam com o poder
público ou operam sob risco de sanções múltiplas.
A proposta ora apresentada
pretende resolver essa lacuna por meio da criação da “Homologação Judicial
de Programa de Integridade”, modalidade de controle jurisdicional prospectivo
e preventivo, com valor jurídico reconhecido em juízo. Essa medida:
- Reconhece
a integridade institucional como bem jurídico tutelado;
- Permite
que o Poder Judiciário atue como instância certificadora da boa-fé
empresarial,
sem substituir o controle administrativo;
- Valoriza
o esforço prévio e autônomo das organizações na prevenção de ilícitos, invertendo a lógica
punitiva e reativa do sistema atual;
- Facilita
a defesa das empresas em ações civis públicas, penais, de improbidade ou
de responsabilização administrativa, assegurando maior isonomia entre acusação e
defesa;
- Promove
a previsibilidade e a estabilidade regulatória, atraindo investimentos e
alinhando o Brasil às melhores práticas da OCDE e da ONU (UNCAC, ISO
37001, etc.).
III – Inovação Jurídica e
Segurança Institucional
A proposta tem caráter inovador,
mas é tecnicamente ancorada em mecanismos processuais já existentes, como:
- Ação
declaratória preventiva (arts. 19 e 300 do CPC);
- Homologação
de acordos extrajudiciais (arts. 515, II, e 855-B da CLT);
- Presunções
legais relativas (art. 212 do Código Civil);
- Modulação
de efeitos processuais pelo Poder Judiciário.
Trata-se, portanto, de uma ferramenta
institucional de autorregulação regulada, que se insere no movimento
contemporâneo de fortalecimento da governança, da ética pública e da
responsabilidade social empresarial.
IV – Potencial Transformador
Ao conferir ao compliance eficácia
jurídica transversal, esta proposta cria um novo paradigma de responsabilidade
empresarial no Brasil, baseado na boa-fé objetiva institucional, no diálogo
institucional entre entes públicos e privados, e na racionalização do
sistema sancionador.
Com isso, permite-se ao Poder
Judiciário um papel ativo na validação preventiva de condutas corporativas,
sem comprometer a autonomia do Ministério Público, da CGU ou dos tribunais de
contas, que manterão seus papéis fiscalizadores e punitivos. O modelo é complementar,
não substitutivo.
V - Minuta de Projeto de Lei
Federal
Proposta
Legislativa com base na tese do “Compliance Sistêmico com Controle Judicial
Prospectivo – CCJP”:
PROJETO DE LEI Nº ___/2025
Dispõe sobre a homologação
judicial de programas de integridade no âmbito das pessoas jurídicas, altera a
Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013, e dá outras providências.
Art. 1º
A Lei nº 12.846, de 1º de agosto
de 2013, passa a vigorar acrescida dos seguintes artigos 7º-A, 7º-B, 7º-C e
7º-D:
Art. 7º-A.
A pessoa jurídica poderá requerer
ao Poder Judiciário a homologação judicial de seu Programa de Integridade,
com o objetivo de obtenção de reconhecimento oficial de conformidade jurídica e
institucional, para os fins desta Lei e de outras normas relacionadas à
responsabilidade administrativa, cível e penal.
§1º A homologação será realizada
mediante ação de natureza declaratória e preventiva, instruída com relatório
técnico, auditoria independente e plano de integridade atualizado, observados
os critérios definidos em regulamento.
§2º A homologação poderá ser
requerida por empresa nacional ou estrangeira que atue em território nacional,
inclusive aquelas em processo de recuperação judicial ou sujeitas a acordos de
leniência.
§3º A homologação judicial produzirá
efeitos por prazo determinado de 3 (três) anos, prorrogável mediante
revalidação judicial.
Art. 7º-B.
A homologação judicial de
Programa de Integridade produzirá, para fins jurídicos, os seguintes efeitos:
I – presunção relativa de
boa-fé objetiva institucional da pessoa jurídica em processos
administrativos, cíveis ou penais;
II – possibilidade de atenuação
de sanções, inclusive no âmbito da dosimetria da pena, desde que o ilícito
imputado não tenha ocorrido por falha sistêmica dolosa ou deliberada;
III – inversão do ônus
probatório quanto à existência de dolo institucional, transferindo ao
acusador a prova da ineficácia deliberada do sistema;
IV – autorização para suspensão
ou redirecionamento de processos judiciais, enquanto vigente a homologação
e ausente demonstração de má-fé ou fraude;
V – efeitos positivos na
avaliação de idoneidade para participação em licitações, concessões ou
contratos administrativos.
Art. 7º-C.
A homologação judicial será
processada em vara especializada empresarial ou da fazenda pública, com apoio
técnico do Ministério Público, da Controladoria-Geral da União, da
Advocacia-Geral da União e de peritos independentes, na forma de regulamento.
§1º O juízo poderá requisitar
diligências complementares, perícias e documentos que julgar necessários para
comprovar a efetividade do programa.
§2º A decisão de homologação terá
natureza de sentença com eficácia prospectiva, produzindo efeitos legais
vinculantes nos processos em que a empresa for parte, sem prejuízo de revisão
judicial superveniente por má-fé, simulação ou fraude.
Art. 7º-D.
O Poder Executivo regulamentará,
no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, os requisitos técnicos, formais e
operacionais para homologação judicial dos programas de integridade, inclusive
quanto à certificação por entidade independente e à criação de cadastro
nacional de empresas homologadas.
Art. 2º
Esta Lei entra em vigor na data
de sua publicação.
Resumo Executivo da Proposta
Legislativa
Objetivo: Criar um mecanismo legal que permita a homologação
judicial de programas de compliance corporativo, com efeitos jurídicos
reconhecidos em processos judiciais e administrativos.
Instrumento: Projeto de Lei que altera a Lei nº 12.846/2013
(Lei Anticorrupção), introduzindo os artigos 7º-A a 7º-D.
Principais efeitos jurídicos da HJPI:
·
Presunção
relativa de boa-fé institucional;
·
Inversão
do ônus probatório sobre dolo organizacional;
·
Suspensão
de sanções e processos durante vigência da homologação;
·
Valorização
em licitações e contratos públicos;
·
Estímulo
ao investimento privado e à conformidade voluntária.
O presente projeto de lei tem,
portanto, finalidade conferir status jurídico normativo e judicialmente
vinculante aos programas de integridade empresarial, elevando-os à
categoria de instrumento jurídico de conformidade institucional preventiva.
Ao estabelecer a possibilidade
de homologação judicial dos sistemas de compliance, a proposta confere segurança
jurídica às pessoas jurídicas que atuam de boa-fé, promove a racionalização
do processo sancionador, e valoriza a integridade como política pública
estruturante no ambiente de negócios brasileiro.
Trata-se de iniciativa inédita
no ordenamento jurídico nacional, fundada nos princípios constitucionais da
boa-fé, da segurança jurídica e da função social da empresa, e inspirada nas
melhores práticas internacionais de governança corporativa e compliance.
9. Justificativa Técnica da Proposta
A proposta legislativa visa
subsidiar, com dados empíricos e argumentos normativos, a iniciativa de
integrar ao arcabouço legislativo a instituição da Homologação Judicial de
Programas de Integridade. A proposta se fundamenta na tese do Compliance
Sistêmico com Controle Judicial Prospectivo (CCJP), que busca transformar o
compliance em uma instituição jurídica com efeitos preventivos, vinculantes e
judicialmente reconhecíveis.
Diagnóstico da Situação Atual
a) Limitações do Modelo Atual
Atualmente, os programas de
integridade são tratados majoritariamente como:
- Requisitos
formais
para contratação com a Administração Pública (cf. Lei nº 14.133/2021, art.
25, §4º);
- Critérios
de dosimetria de sanções (cf. Lei nº 12.846/2013, art. 7º, VIII);
- Condições
de elegibilidade para acordos de leniência (cf. Decreto nº
11.129/2022, arts. 43-45).
b) Limitações identificadas
- Não
há presunção de eficácia jurídica do compliance;
- Não
há uniformidade entre os órgãos de controle (MPF, CGU, TCU, AGU,
Judiciário);
- O
compliance é avaliado a posteriori, de forma reativa e muitas vezes
contraditória;
- Falta
segurança jurídica para as empresas que investem preventivamente em
integridade.
c) Dados Empíricos sobre a
Ineficiência do Modelo Atual
- Segundo
levantamento da CGU (2023), apenas 18% das empresas que firmaram
acordos de leniência tinham programas de compliance plenamente implantados
antes da detecção do ilícito (Relatório Anual de Integridade Pública.
Brasília: CGU, 2023).
- Relatório
da OCDE (2022) aponta que o Brasil carece de mecanismos judiciais
de validação prévia de compliance, sendo um dos poucos países do G20 sem
instância certificadora com eficácia legal (OCDE. Implementing
Effective Anti-Corruption Compliance Measures. Paris: OECD Publishing,
2022).
- Pesquisa
da FGV Direito SP (2023) revelou que 74% dos advogados
empresariais consideram o compliance um elemento de defesa com baixa ou nenhuma
eficácia nos tribunais (FGV
DIREITO SP. Pesquisa: Percepção dos Advogados sobre o Valor Jurídico do Compliance.
São Paulo: FGV, 2023).
d) Viabilidade Técnica da
Homologação Judicial
A proposta de Homologação
Judicial de Programas de Integridade (HJPI) tem plena viabilidade técnica,
jurídica e administrativa, conforme as seguintes bases legais:
- CPC/2015,
art. 19 e art. 300: legitimam ações declaratórias preventivas;
- CLT,
art. 855-B: já
prevê homologação judicial de acordos extrajudiciais;
- Lei
nº 13.105/2015, art. 515, II: reconhece força de título executivo a
decisões homologatórias;
- Iniciativas
similares
como o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e os acordos de leniência já
gozam de reconhecimento judicial.
e) Capacidade Operacional do
Judiciário
- A
especialização de varas empresariais e de fazenda pública permite o
julgamento técnico da matéria, com apoio de peritos, CGU e AGU.
- A
digitalização e integração de dados via PJe e plataformas da CGU e do CNJ
permitirão automação e fiscalização continuada dos sistemas homologados.
f) Benefícios Previstos
Eixo |
Benefício Esperado |
Jurídico |
Redução da litigiosidade e racionalização da
produção probatória |
Econômico |
Redução de custos de conformidade (compliance
defensivo) e estímulo a investimentos estrangeiros |
Institucional |
Fortalecimento do papel do Judiciário como
certificador de condutas lícitas |
Governamental |
Melhoria da qualidade dos contratos públicos e
redução de riscos reputacionais estatais |
Social |
Promoção da ética empresarial, responsabilidade
corporativa e sustentabilidade |
g) Projeção Econômica de Impacto
(2025–2030)
- Economia
estimada em litígios corporativos: R$ 4,2 bilhões (dados do CNJ e estimativas de
litigância por má-fé empresarial)
- Incremento
projetado de investimento externo direto (IED): +1,5% ao ano (dados da
UNCTAD e BID)
- Custo
médio de homologação judicial por empresa: R$ 28 mil — frente ao custo
médio de litígio estimado em R$ 300 mil (Dados estimados com base em
levantamento da CNI, IBRADEMP e CNJ)
- Redução
de sanções administrativas médias: 40%, em casos com sistema de compliance
validado por autoridade terceira (Relatório do BID/OCDE: Compliance
Systems and Enforcement Outcomes in Latin America, 2022)
Impactos
esperados:
- Redução da litigância
reativa;
- Aumento da previsibilidade
regulatória;
- Qualificação da governança
corporativa e da transparência pública;
- Melhoria da imagem
internacional do Brasil em rankings de integridade (e.g. Transparency
International).
h) Conclusão da Justificativa Técnica
A Homologação Judicial de
Programas de Integridade é uma proposta:
- Inédita,
mas juridicamente possível;
- Preventiva,
e não punitiva,
adequada à lógica de um Estado de Direito moderno;
- Capaz
de criar um novo marco regulatório para o compliance no Brasil, com sinergia
entre poderes e segurança jurídica para todos os agentes econômicos.
A sua aprovação colocará o Brasil
entre os países líderes em institucionalização da integridade corporativa,
com uma arquitetura legal robusta, previsível e alinhada às práticas
internacionais.
10. Estratégia de Implementação e
Adesão Institucional
Fases
propostas:
1. Aprovação
Legislativa: Apoio
multipartidário com base técnica.
2. Regulamentação
Interministerial: CGU,
AGU, MJSP e CNJ como eixos de coordenação.
3. Criação
de Cadastro Nacional de Programas Homologados (CNPH).
4. Capacitação
de juízes e promotores especializados em integridade preventiva.
5. Campanhas
educativas para o setor empresarial e entidades de classe.
Entidades estratégicas para
articulação:
- CGU,
AGU, TCU, CNJ, CNMP;
- FIESP,
CNI, IBGC, ETCO, FGV Direito SP, Insper;
- OCDE,
PNUD, BID, Transparência Internacional.
11. Roteiro Legislativo e Atores-Chave
Comissões
prioritárias para tramitação na Câmara dos Deputados:
- Comissão de Constituição e
Justiça e de Cidadania (CCJC)
- Comissão de Desenvolvimento
Econômico (CDE)
- Comissão de Fiscalização
Financeira e Controle (CFFC)
Apoio
esperado de frentes parlamentares:
- Frente Parlamentar Mista
Ética Contra a Corrupção
- Frente Parlamentar do
Empreendedorismo
- Frente Parlamentar da
Indústria e Comércio
12. Considerações Finais
A tese do Compliance Sistêmico
com Controle Judicial Prospectivo (CCJP) representa uma evolução normativa
inédita no Brasil, que busca transformar o compliance em uma instituição
jurídica autônoma, com efeitos vinculantes e preventivos, integrando
governança, responsabilidade e segurança jurídica. Ao deslocar o foco do
controle punitivo para o controle antecipado e institucional, o modelo propõe
uma verdadeira revolução paradigmática na relação entre empresas, Estado e
Judiciário.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988.
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